Tão importante quanto o parceiro do herói (quando ele existe), sua namorada (quando ela existe), seu passado (quando nos é revelado) e suas motivações, é a cidade onde o herói reside. É impossível não pensar em Batman sem pensar em Gotham City ou no Super-Homem sem Metropolis, no Starman sem Opal City ou nos heróis da Marvel sem Nova York. Mais do que ser o local onde o herói mora e vive suas aventuras, a cidade reflete aspectos da própria personalidade do seu notório morador. Gotham é sombria como Batman, Metropolis é clean como Super-Homem, e a Nova York da Marvel é um poço de diversidades e surpresas como os heróis que nela vivem.
Se uma cidade é assim tão importante e característica na vida de um herói, por que não escrever uma revista sobre uma cidade cujos heróis e outros moradores são importantes para a vida dela? Partindo desse ponto, Kurt Busiek, conhecido principalmente por seu trabalho na minissérie Marvels e nas séries Vingadores e Thunderbolts, criou a série e a cidade Astro City, publicada originalmente pela Wildstorm e a DC trouxe de volta pelo selo Vertigo no último mês.
Astro City é uma cidade que reúne em si todos os aspectos de suas antecessoras: é "dark" como Gotham, iluminada como Metropolis e diversificada como a Nova York da Marvel, entre outras qualidades. E um dos charmes da cidade (e da revista) reside exatamente nessa variabilidade de qualidades que torna, paradoxalmente, Astro City única.
Existe um dito tipicamente americano, muito comum em filmes noir, que diz que "existem milhares de histórias na cidade, essa é apenas uma delas". Pois Busiek inverte completamente esse conceito: para ele, se existem milhares de histórias na cidade (no caso, Astro City), por que contar apenas uma, por que não contar as milhares, ou pelo menos o máximo possível? E é isso que ele faz, e, dependendo do teor da história, um dos aspectos da cidade é ressaltado.
Extremo conhecedor da cronologia e das histórias das personagens de HQs, especialmente das duas maiores editoras do mercado, DC e Marvel, Kurt Busiek se utiliza disso na criação de suas personagens e histórias.
Não é por acaso que Samaritan lembra o Super-Homem, que Winged Victory remete-nos à Mulher Maravilha, Confessor e Altar Boy a Batman e Robin, que a Honor Guard seja a liga da Justiça de Astro City, que Jack-In-The-Box tenha um quê de Homem-Aranha e Demolidor, que a First Family, seja na sua composição, aparência, ou no nome (e iniciais) seja inspirada no Quarteto Fantástico (Fantastic Four). Ou até mesmo que o espírito denominado The Hanged Man, protetor da região de Shadow Hill, a colônia de imigrantes do leste europeu de Astro City, assombrada por espíritos e afins, tenha um modelo externo na figura do Desafiador (Deadman), da DC. Isso sem falar em muitos outros exemplos.
Ao contrário do que línguas ferinas e invejosas possam dizer, não se trata de plágio ou cópia. Essas semelhanças são intencionais. São uma forma de Busiek homenagear todos os heróis originais, ao mesmo tempo em que busca através disso explorar aspectos dessas personagens, em suas contrapartes de Astro City, que a estrutura comercial de suas revistas ou aspectos de suas intricadas cronologias não permitiriam.
Coisas tais como um herói extremamente poderoso como o Super-Homem, no caso o Samaritan, ser incapaz de viver uma vida normal como qualquer um de nós através de seu alter-ego, ou até mesmo encontrar prazer no uso de seus poderes, por estar por demais ocupado com as responsabilidades de salvar vidas e proteger inocentes que esses poderes lhe trazem. Ou ainda uma criança como Franklin Richards, filho do Sr. Fantástico e da Mulher-Invisível do Quarteto, representado na figura de Astra, filha de membros da First Family, podendo se sentir sozinha e isolada, apesar de todas as incríveis aventuras que vive com sua família, e cujo maior desejo seria conviver com outras crianças de sua idade.
Por vezes, os protagonistas das histórias não são heróis, mas cidadãos comuns de Astro City. Assim como fez em Marvels, através da figura do fotógrafo Phil Sheldon, Busiek mostra o ponto de vista da pessoa comum sobre os acontecimentos fantásticos que a cercam. Uma das melhores histórias nesse estilo fala das conseqüências de eventos, como Crise nas Infinitas Terras, na vida de uma pessoa normal.
Na época da Wildstorm, através do selo Homage era desenhada por Bret Anderson. As capas e o visual das personagens ficavam a cargo de Alex Ross (O Reino do Amanhã, Marvels). Ambos retornaram no relançamento pelo selo Vertigo.
A série já ganhou vários prêmios, inclusive o prêmio Eisner, a maior premiação das HQs. A Pixel trouxe alguns números para o Brasil, mas, infelizmente, não a série inteira.
A série já ganhou vários prêmios, inclusive o prêmio Eisner, a maior premiação das HQs. A Pixel trouxe alguns números para o Brasil, mas, infelizmente, não a série inteira.
Agora é torcer para a série fazer novo sucesso na Vertigo e, quem sabe, ser novamente publicada aqui pela Panini, pois realmente vale a pena visitar essa cidade, suas histórias e personagens.
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